Uma pesquisa feita pela Childhood Brasil, em parceria com a Universidade Federal de Sergipe, mostrou que o perfil dos caminhoneiros brasileiros vem se alterando nos últimos anos. Essa pesquisa foi realizada em 2021, durante a pandemia de Covid-19 e mostra que o profissional da área é homem, com média de 45 anos, ensino médio completo, de maioria católica, têm renda média de 2,9 salários-mínimos e acumula cerca de 18 anos na profissão.
O estudo é uma iniciativa que nasceu, em 2005 com o objetivo de tentar entender como vive e o que pensa esse profissional da estrada, costumeiramente associado como “cliente” da exploração sexual de meninos e meninas. A pesquisa busca desvendar o universo do comportamento sexual de quem passa a maior parte dos dias longe de casa e sujeito a condições de trabalho muitas vezes exaustivas e difíceis.
Programa tem reduzido casos de abuso sexual infantil nas estradas brasileiras. Foto: Domínio Público/Site: Caminhões e Carretas.
E o perfil dos caminhoneiros vem mudando bastante segundo a pesquisa. A comparação com as outras três pesquisas feitas anteriormente mostra um aumento do percentual de evangélicos, conforme tendência da população geral no Brasil; o ‘envelhecimento’ dos profissionais, puxado especialmente pela categoria de autônomos e uma queda da renda real do profissional – atualmente de 2,9 salários-mínimos que era de 4,55 5,77 salários mínimos em 2015 e 2010, respectivamente.
Além disso, o conservadorismo se destaca acompanhado de indicadores de machismo, com alto grau de concordância para questões como pena de morte, porte de arma e redução da maioridade penal. A pesquisa também traz elementos importantes sobre como o aumento do acesso à internet impacta na relação do trabalho dos caminhoneiros; atualmente, 82% dos profissionais usam o celular quando param na estrada; em 2005, o percentual era de 32%.
Exploração sexual de crianças e adolescentes – ESCA
Um dos maiores destaques da pesquisa foi a diminuição significativa do relato de envolvimento com a exploração sexual de crianças e adolescentes. Entre os dados que amparam esta percepção está a afirmação direta de que 90% dos pesquisados não fizeram sexo com esse grupo específico nos últimos cinco anos. Em 2015, 87% responderam afirmativamente à mesma questão e em 2005 apenas 63% afirmavam não terem feito sexo com crianças e adolescentes nos últimos cinco anos.
Sobre o envolvimento próprio com comércio sexual e exploração sexual de crianças e adolescentes (ESCA), 20,5% concordaram com a afirmativa “Eu costumo sair com prostitutas” e 7,2% concordaram com “Acho que alguma prostituta com quem saí tinha menos de 18 anos”. Os índices mostram uma queda em relação a 2015, quando 26,4% relataram costumar sair com prostitutas e 12,7% achavam que alguma delas tinha menos de 18 anos. E mais de 60% relatam que ainda conseguem testemunhar situações de exploração sexual nas estradas, especialmente do Norte e Nordeste.
Rotina na estrada
Em relação ao tempo que os caminhoneiros passam na estrada e o tempo de espera por carga, em 2021, na amostra aleatória, os motoristas relataram uma média de 21,94 dias a cada viagem. Os dias ociosos ou a espera tem sido associada a um aumento de chances de envolvimento em situações de risco.
Entre as atividades mais realizadas enquanto estão parados (esperando por carga ou descansando na viagem, estão: usar o celular, usar a internet, dormir, conversar com os amigos, conhecer a cidade, ver TV, ler, beber e fazer sexo. Em 2021, fazer sexo ficou em 9º lugar. Em 2015, estava em 5º.
As demandas dos profissionais continuam sendo por questões básicas, como banheiros e comida. Destaca-se a grande e crescente demanda por internet - 94,4% dos caminhoneiros indicaram a necessidade de banheiros limpos; 88,8% comida barata; 83,2% comida boa; 71,6% internet/Wi-Fi.
Destaca-se o aumento das queixas sobre insegurança e violência, assim com a má qualidade das estradas. Além disso, a queixa sobre o preço do combustível foi destacada em 2021. Os motoristas demostraram alta insatisfação nos últimos anos, configurando o que eles denominaram como “abandono” do setor, pois não percebem melhorias nas estradas em obras e classificam o preço do combustível como impraticável.
Presença feminina
Esta edição contou com um questionário especialmente pensado para as mulheres caminhoneiras. Apesar do baixo percentual de mulheres ouvidas na pesquisa, trata-se da primeira iniciativa de entender essas profissionais que tem ampliado sua participação em uma atividade tradicionalmente ocupada por homens nas estradas do Brasil.
O levantamento aponta que as mulheres ouvidas relataram estabelecerem boas relações com colegas e funcionários dos locais de parada, carga e descarga. Outro destaque é que elas relatam que a presença feminina nos locais não é totalmente estranha ou nova, pois há funcionárias mulheres nos locais de parada e também a presença das esposas dos caminhoneiros, com quem as caminhoneiras relatam ter ótima relação.
Sobre as questões de comércio do sexo e exploração sexual nas estradas, as mulheres entrevistadas relataram um cenário similar ao informado pelos homens: presença do comércio do sexo e sabem da existência da exploração que envolve crianças e adolescentes. No entanto, como as rotas e locais de parada são mais limitados, elas relatam ter pouco contato com os ambientes mais vulneráveis. As mulheres dizem perceber que a presença feminina limita a abertura dos homens para atuação ou até conversas sobre estas questões.
A pesquisa “O Perfil do Caminhoneiro Brasileiro” entrevistou 268 motoristas de caminhão em diversas cidades do Brasil, sendo 215 de forma aleatória e 53 de um grupo de controle de empresas participantes do Programa Na Mão Certa. Assim como nas edições anteriores, foi considerada a estimativa de que o Brasil possui cerca de 2 milhões de caminhoneiros, aplicado uma margem de erro de 10% e nível de confiança de 90%.
Pamela Emerich
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