A vida de quem vive nas estradas é cheia de contratempos e isso faz com que a rotina não seja tão simples como muitos pensam, afinal, não é só sentar e dirigir, né? Muitas outras coisas envolvem o dia a dia da profissão, como horas dentro da cabine, inúmeros riscos no percurso, trânsito, prazos apertados, clientes exigentes e outras situações que tornam essa função bastante desafiadora. Somada a essa correria, a falta de cuidados básicos com a saúde pode comprometer a saúde do caminhoneiro.
Sabemos que no Brasil ainda temos uma maioria masculina no mercado do transporte, cerca de 93.8% dos profissionais são homens. Por si só, a grande maioria, independentemente se é caminhoneiro ou não, tem mais dificuldade em ter cuidados com sua saúde. Frequências médicas, exames preventivos, boa alimentação, entre outros cuidados, estão ainda longe das prioridades para a maioria masculina. Assim, torna-se mais fácil o desencadear de outros problemas de saúde.
A saúde dos caminhoneiros nas estradas é um assunto que ganha cada vez mais espaço nos debates entre empresas e profissionais. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a hipertensão arterial e a diabetes são as doenças que mais atingem os caminhoneiros no país, seguidas por obesidade e doenças cardiovasculares. E, ainda, segundo a agência, problemas de saúde contribuem para ao menos 15% dos acidentes de trânsito, o que também afeta a segurança.
Além disso, o corpo acumula o resultado dos anos passando o dia inteiro sentado, sem se movimentar, com uma postura errada na maioria das vezes, o que é péssimo para a musculatura paravertebral, aquela que corre dos dois lados da coluna. Isso faz com que, com frequência, esses profissionais sintam dores nas costas e se movimentem ainda menos, entrando num ciclo de dor e desgaste muito grande.
E, não basta apenas garantir que a pressão esteja boa. As doenças que acometem os caminhoneiros podem ser tanto físicas, causadas por maus hábitos e por esforços repetitivos, quanto mentais, causada por fatores sociais. A rotina de viver longe de casa, da família e amigos não é uma tarefa fácil e apesar de ser um fator que os profissionais conhecem bem, a saudade quase sempre é um empecilho que os caminhoneiros lidam silenciosamente.
Mas, a falta de atenção com a saúde de muitos caminhoneiros não está relacionada somente à rotina corrida. Quando o profissional é funcionário de uma empresa, que oferece o básico para que ele permaneça saudável, como convênio médico ou programas que mantêm exames regulares, ele se sente mais seguro para cuidar de si. Pois, com o apoio da empresa, pode eventualmente marcar uma consulta e receber um suporte em relação ao tempo que vai precisar para se cuidar.
Porém, para os autônomos, o impedimento de fazer entregas devido a problemas de saúde traz severos prejuízos. Por isso, muitos profissionais nessas condições preferem ir levando até onde conseguem e ignorando sinais de que alguma coisa precisa ser investigada. E é aí que está o problema, porque quando falamos de saúde, o tempo é crucial. O assunto é tão importante que, todos os anos, vemos ações nas estradas voltadas para a melhoria da saúde dos profissionais, que fazem atendimentos básicos, como aferição da pressão arterial, temperatura e exames de rotina.
Manter hábitos saudáveis, com horários flexíveis de alimentação e uma rotina menos estressante, está longe de fazer parte do dia a dia da grande maioria dos motoristas de caminhão e, por conta disso, eles se tornam fortes candidatos a desenvolverem doenças que, na maioria das vezes, agem de maneira silenciosa e podem até levar o indivíduo à morte se não tratadas de maneira correta. Confira as mais comuns.
1 - Diabetes
O diabetes é provocado pela deficiência de produção ou falta de ação da insulina. As principais consequências para aqueles que não sabem que possuem a doença, ou mesmo os que sabem mas não realizam o tratamento correto, são a possibilidade de uma crise de hipoglicemia (baixo nível de açúcar no sangue) ou hiperglicemia (excesso de açúcar no sangue).
No caso dos carreteiros, profissionais que passam boa parte do tempo dirigindo, uma dessas crises pode comprometer a segurança. Os sintomas mais comuns são tremedeiras, desequilíbrio, perda de coordenação, tontura, sonolência e visão embaçada. Essas situações podem levar o indivíduo a perder o controle do veículo e provocar acidente.
2 - Colesterol
O aumento do nível de colesterol no sangue não costuma ter sintomas, mas é muito perigoso. Esse excesso de gordura pode se depositar nas paredes das artérias (que são os vasos que levam sangue aos órgãos e tecidos), determinando um processo conhecido com arteriosclerose. Se esse depósito ocorre nas artérias coronárias, pode causar dor no peito e infarto do miocárdio. Se ocorrer nas artérias cerebrais, pode provocar acidente vascular cerebral (derrame).
Quando o colesterol atinge níveis muito altos, pode haver um aumento do fígado, do baço e sintomas de pancreatite. Gema de ovo, bacon, carne de frango com pele, torresmo, manteiga, creme de leite e nata, frituras, salsicha, salame, linguiça e carnes de animais no geral, são os principais alimentos que contêm significativa quantidade de colesterol.
3 - Hipertensão
A doença é determinada pelos níveis elevados da pressão sanguínea nas artérias e faz com que o coração tenha que exercer um esforço maior do que o normal para fazer com que o sangue seja distribuído de forma equilibrada no corpo. Entre as causas da hipertensão estão o consumo de bebidas alcoólicas, fumo, obesidade, sedentarismo, estresse, consumo elevado de sal, níveis altos de colesterol, diabetes e o sono inadequado. Os sintomas da hipertensão costumam aparecer somente quando a pressão sobe muito. Entre eles estão dores no peito, dor de cabeça, tonturas, zumbido no ouvido, fraqueza, visão embaçada e sangramento nasal.
4 - Lombalgia
A lombalgia, popularmente conhecida como dor nas costas, é uma das principais consequências da rotina dos carreteiros, profissionais que passam muito tempo ao volante do caminhão e se exercitam pouco. Entre as principais causas estão erro de postura, bancos não ergonômicos, falta de apoio para o pescoço e braços, longas horas de trabalho contínuo sem pausa para descanso, sedentarismo, obesidade, falta de alongamentos, poucas horas de sono e uso de medicamentos estimulantes.
Para reduzir as chances de desenvolver a lombalgia é necessário mudança de hábitos, tais como regular os níveis de estresse, fazer atividades físicas regularmente, controlar a alimentação e peso e melhorar a orientação postural.
5 - Obesidade
A obesidade é o acúmulo excessivo de gordura corporal no indivíduo e acontece quando a ingestão alimentar é maior que o gasto energético correspondente. O obeso tem mais propensão a desenvolver problemas como hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, entre outras.
O excesso de peso pode estar ligado tanto à genética, quanto a maus hábitos alimentares ou, até mesmo, disfunções endócrinas. Para o diagnóstico em adultos, o parâmetro utilizado mais comum é o do Índice de Massa Corporal (IMC). A obesidade é fator de risco para uma série de doenças. O IMC é calculado dividindo-se o peso (em kg) pelo quadrado da altura (em metros).
Classificação do IMC:
Menor que 18,5 – Abaixo do peso.
Entre 18,5 e 24,9 – Peso normal.
Entre 25 e 29,9 – Sobrepeso (acima do peso desejado).
Igual ou acima de 30 – Obesidade.
6 - Estresse
O estresse pode ser caracterizado por sensações de medo, desconforto, preocupação, irritação, frustração, indignação e nervoso, podendo ser motivado por diversos fatores. Queda de cabelo, impaciência, tontura e dor de cabeça frequente são sintomas que podem indicar estresse, que pode estar ligado ao aumento dos níveis de cortisol na corrente sanguínea, ocorrência que, além de afetar a mente, pode levar a doenças físicas, como alergias e tensão muscular, por exemplo. O estresse pode provocar insônia, transtornos alimentares, depressão, problemas cardiovasculares, síndrome do intestino irritável e prisão de ventre.
7 - LER (Lesões por esforço repetitivo)
O termo LER refere-se a um conjunto de doenças que atingem, principalmente, os membros superiores, atacam músculos, nervos e tendões provocando irritações e inflamação dos mesmos. Geralmente é causada por movimentos repetidos e contínuos.
O esforço excessivo, má postura, estresse e más condições de trabalho também contribuem para o aparecimento da LER. Em casos extremos pode causar sérios danos aos tendões, dor e perda de movimentos. A LER inclui várias doenças, como tenossinovite, tendinites, epicondilite, síndrome do túnel do carpo, bursite, dedo em gatilho, síndrome do desfiladeiro toráxico e síndrome do pronador redondo.
Como esses profissionais lidam com a questão da saúde mental?
Se a saúde física muitas vezes é deixada em segundo plano, a saúde mental poucas vezes entra em pauta. Nos últimos anos, o assunto tem sido amplamente discutido, principalmente, com a criação de programas voltados especialmente aos cuidados com a saúde mental. E não se assuste: cerca de 50 milhões de pessoas sofrem algum tipo de doença mental, segundo dados da Associação Brasileira de Psiquiatria. Os diagnósticos são variados: depressão, transtornos de humor, déficit de atenção, ansiedade, entre outros. São doenças que podem afetar todas as faixas etárias, de crianças a idosos.
Diferente de outras doenças físicas, a doença mental é silenciosa. A falta de cuidado com a saúde mental, num primeiro momento, pode não resultar em nada, mas com o passar do tempo e com a falta de atenção, os sintomas do estresse ou até mesmo da depressão aparecem suavemente. Aí, quando se percebe, a situação já está grave demais. Para se ter uma ideia, a depressão está entre as seis maiores causas de afastamentos dos caminhoneiros pelo INSS.
Além de toda a pressão que o caminhoneiro é submetido no dia a dia e do tempo que passa longe dos seus familiares, muitas vezes as condições de trabalho, que não são culpa dele ou da empresa, também afetam a saúde mental. As estradas brasileiras são muito inseguras, com altos riscos de acidentes e assaltos e isso, claro, dobra a tensão. Então, quando o profissional para o caminhão na beira da estrada à noite, não consegue relaxar, porque está cheio de problemas.
É nesse contexto que o profissional tem contato com entorpecentes para conseguir lidar com tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo. Então, o caminhoneiro muitas vezes recorre ao álcool, a estimulantes e outras drogas, que muitas vezes são pesadas e causam dependência. Nesses casos, o risco de morte aumenta e muito, já que dobra a probabilidade de acidentes dentro e fora da estrada.
O que pode ser feito para melhorar essa realidade?
A boa notícia é que com pequenas atitudes, o caminhoneiro pode evitar esses inconvenientes e ganhar em qualidade de vida. E não são necessárias mudanças radicais no cotidiano para ter uma rotina menos prejudicial. Toda vez que parar o caminhão, antes de jantar, por exemplo, faça uma caminhada. Procure adquirir uma postura adequada no caminhão, mais ereta. Isso já pode trazer melhorias para a circulação, sedentarismo, dores nas costas ou nas pernas, inchaços etc.
É importante também fazer os controles de pressão arterial. Apesar de existir uma crença de que a pressão alta provoca dores de cabeça, tontura e outros sinais, isso só acontece quando ela já está muito alta e não é em todos os casos. A pressão arterial pode ser uma inimiga silenciosa para os caminhoneiros e só é possível identificar através do controle frequente. Também é necessário fazer o controle periódico da diabetes e mudar a dieta, mesmo com a alimentação sendo feita em pontos de parada. A alimentação também é importante, já que está ligada diretamente a diabetes, outra doença constante na categoria. Então, fique de olho no que come não só na estrada, mas também em casa.
Além disso, mantenha os veículos em ordem e faça inspeções nos assentos para evitar problemas na coluna. Também é fundamental programar alguns exames preventivos e incentivar a prática de exercícios, inclusive durante as viagens. O perfil dos caminhoneiros brasileiros indica que muitos já passam dos 40 anos e é preciso ter uma atenção especial com a saúde nessa fase da vida.
Os caminhoneiros fazem parte de um segmento que tem uma importância enorme e estão presentes em todas as estradas do país. Por isso, desenvolver ações e políticas que promovam a saúde desses profissionais é bom para todos. Então, fique atento aos sinais e não deixe de consultar um médico ao menor sinal de problema.
E você, estradeiro, está com seus exames em dia? Participe com a gente e não deixe de compartilhar com seus amigos do trecho.
Pamela Emerich
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