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Abram alas para o Ford: F-600, o primeiro Fordão do Brasil não era 100% brasileiro

Abram alas para o Ford: F-600, o primeiro Fordão do Brasil não era 100% brasileiro

Uma das pioneiras na montagem e fabricação de veículos no país foi a Ford, que participou de um importante processo de nacionalização e foi uma das empresas que mais se desenvolveram e, ao mesmo tempo, contribuíram com o crescimento do país. A inesquecível rivalidade entre Ford e Chevrolet na chegada dos veículos no país trouxe clássicos para a história dos caminhões brasileiros.



Atenta ao mercado brasileiro, a diretoria da Ford Motor Co. decidiu criar filial no Brasil, em 1919, um escritório e linha de montagem para a fabricação do Modelo T. Esta foi a primeira indústria automobilística a se instalar no país. Mal haviam estradas, quanto mais pavimentadas, mas os modelos de produção da Ford, que favoreciam o transporte dos veículos para longas distâncias, popularizou a marca. Até que em 1923 foi montado o primeiro caminhão Ford brasileiro.

A empresa se manteve nos primeiros anos, produzindo caminhões em operação por CKD (recebia as peças do exterior e realizava a montagem nas unidades brasileiras). A presença da Ford crescia em todas as frentes do transporte e atuou principalmente para a expansão das nossas divisas e fronteiras. Uma figura bastante comum para essa época e que estava associada ao Ford era o Marechal Cândido Rondon, um fiel usuário do Ford T em seus deslocamentos pelo sertão.



Os primeiros veículos da Ford também serviram de base para a construção das nossas primeiras “jardineiras”, carrocerias de madeira utilizadas para o transporte de passageiros, que foram introduzidas pela Grassi em 1936, dando origem ao que se tornaria a indústria brasileira de ônibus. O período entre guerras não permitiu que a Ford acelerasse seu desenvolvimento na América Latina. A primeira geração de utilitários Ford produzidos em solo brasileiro, eram projetos desenvolvidos nos Estados Unidos no pós-guerra, entre os anos de 1946 e 1950. Para o Brasil eles receberam algumas adaptações para a nossa realidade e iniciaram a produção.



Mas em 1948, colocou em produção o F-Series, uma série de caminhões leves e caminhões médios (Classe 2-7), que incluía picapes de tamanho normal, caminhões de chassis e veículos comerciais. Porém, mesmo que não houvesse apresentado grandes novidades no Brasil, ao completar 30 anos no país em 1949, a Ford já havia montado mais de 200.000 veículos. Na época, a industrialização ainda estava engatinhando, mas a partir de 1956 a política industrial brasileira passou por um momento de transição e passaram a surgir iniciativas do governo para incentivar a nacionalização de veículos.

Quando o projeto da Ford foi aprovado, no final de 1956, a quase totalidade dos componentes das cabines já era estampada no Brasil; a produção de algumas partes era terceirizada, caso das caçambas de picapes fornecidas pela Máquinas Piratininga e algumas centenas de itens diversos eram adquiridos junto a outros fabricantes nacionais.



Somente em 1957, a já estabelecida montadora lançou o seu primeiro clássico. Saía da linha de produção o F-600, primeiro caminhão Ford fabricado no Brasil, que tinha 40% de índice de nacionalização. Ele fazia parte da tradicional linha F da Ford, equipado com motor V8 de 4,5 litros a gasolina, com potência de 161 cv e capacidade de 6,5 toneladas. Mesmo o pesado não sendo 100% brasileiro, pois mais da metade das peças era importada dos EUA, já foi um avanço para a marca, pois até então o caminhão todo era importado e apenas montado no Brasil.



O F-600 era um modelo convencional, de porte médio e cabine recuada; tinha caixa de quatro marchas e diferencial de duas velocidades, com reduzida de comando elétrico. Assim que foi lançado se aventurou em uma excursão que saía da fábrica da Ford no bairro do Ipiranga, em São Paulo, com destino à Caruaru, Pernambuco, onde enfrentou 1.500 km dos quais 400 km eram de rodovias pavimentadas. O sucesso desse teste firmou a Ford como a produtora de veículos resistentes.

Os governos brasileiros, mesmo no período militar, implantaram diversas políticas de planejamento e de investimento em infraestrutura de transportes nas áreas estratégicas do território nacional, que atraíam trabalhadores e geraram grande expectativa em relação a geração de renda através de atividades industriais, agropecuárias, agroindustriais e comerciais. Durante o processo de modernização econômica do país, a indústria automobilística foi o símbolo da expansão do capital internacional no Brasil, influenciando a política de transporte brasileira. Com isso, o país centralizou investimentos no modal rodoviário, deixando outras formas de transporte para o passado.



Dentro do programa de industrialização que foi iniciado pelo então presidente Juscelino Kubitschek, a Ford, assim como a GM/Chevrolet, apostou nos caminhões para serem seus primeiros veículos de fabricação brasileira. O F-600 estreava para aumentar a competitividade entre as empresas. Os primeiros caminhões lançados tinham desenho similar aos modelos norte-americanos de alguns anos antes.



O Ford F-600 se popularizou principalmente porque foi muito usado durante a construção de Brasília, puxando cargas de São Paulo até o centro do Brasil, onde estava sendo erguida a futura capital do país. Teve muita aceitação nacional, tanto que esses veículos passaram a ser utilizados para diversas outras finalidades dos governos brasileiros. Em 1961, o Ford F-600 mudou um pouco e já vinha equipado com o motor rV8 272 a gasolina, de 4.5 litros e 164 cv. O caminhão atingiu a incrível marca de 40.000 unidades produzidas desde o lançamento, um número bastante significativo em uma época onde o Brasil engatinhava economicamente e ainda iniciava seu processo industrial.

Já na década de 60, as indústrias Ford passaram por uma grande reformulação e dobrou-se à realidade local, que aceleradamente se afastava dos motores a gasolina no transporte de cargas, lançando seu primeiro veículo diesel. Equipado com motor Perkins de seis cilindros e 125 cv, o F-600 Diesel recebeu poucas modificações com relação ao modelo a gasolina: apenas reforço da suspensão dianteira e substituição do logotipo “V8” na grade por outro, nomeando o novo combustível. No ano seguinte, o caminhão médio ganhou a versão F-600-148″, com menor entre-eixos (3,77 m), próprio para receber carroceria basculante ou 5ª roda, com capacidade de tração de 12 t.



Em 1962, a Ford lançou no mercado a linha SuperFord, que tinha como diferencial uma cabine inteiramente nova e mais confortável, mas sem alterações mecânicas significativas, apenas o comando hidráulico da embreagem, que assim como os freios, tinha pedal suspenso. A carroceria, no entanto, era totalmente nova, com quatro faróis, pedais suspensos, estribos embutidos e sistema de ventilação interna melhorado; a picape recebeu para-choques traseiros.



Com o tempo, aos modelos básicos foram agregadas diversas variantes, totalizando 14 e a maioria delas destinada a encarroçadoras e oficinas fabricantes de veículos especiais. O F-600 e F-600 Diesel dispunham de três variantes cada: com cabine, só com para-brisa ou na versão mais nua, sem para-brisa, apenas curvão, capô e para-lamas. Em 1964, a Ford chegou a marca de 100 mil caminhões fabricados no Brasil, somente sete anos após a sua fabricação, com praticamente 90% de produção nacional.



Ao longo de 1963 e 64, os ânimos do cenário político brasileiro não estavam tão favoráveis e a Ford se retraiu, não tendo sequer participado do IV Salão do Automóvel, mesmo que ainda pudesse comemorar a incrível marca. Somente em 1965 voltaram as novidades, com a apresentação, em fevereiro, da linha renovada de caminhões (grade e capô de novo desenho) e o lançamento de dois modelos de picapes, uma “para trabalho” e outra para lazer, batizadas Rancheiro e Passeio; além do estilo, as diferenciava a suspensão mais macia (novas molas e amortecedores) e as rodas de menor diâmetro, na segunda.



Com tantas mudanças e adaptações, em 1968 já haviam 200.000 caminhões Ford rodando pelo país. Em 1975, a fabricante decidiu renovar por completo e saiu na frente apresentando o F-4000, equipado com motor MWM a diesel. Estes veículos foram os precursores dos primeiros cavalos-mecânicos da Ford, os modelos F-7000, FT-7000, F-8000 e FT-8000, lançados em 1977.

Em 2000, a Ford deu um novo passo na história dos caminhões no Brasil. Inaugurou uma nova fábrica em São Bernardo do Campo/SP e, em 2005, para celebrar os 20 anos da também histórica linha Cargo, lançou a primeira fase da linha com novos motores eletrônicos. Neste ano, toda a linha Cargo, desde o mais leve Cargo 815 e até o pesado Cargo 4432 e Maxton, haviam recebido os novos motores eletrônicos Cummins.



Atualmente, as duas famílias de caminhões da marca, a Série F, com cabine convencional, e a linha Cargo, com cabine avançada, oferecem 16 modelos e várias possibilidades de customização, com capacidade de carga de 3,5 a 50 toneladas para diversos tipos de aplicações. Todos os caminhões da marca que foram produzidos no Brasil são equipados com motor Cummins, eletrônicos, de quatro ou seis cilindros (DG).

Quando a Ford encerrou a fábrica de São Bernardo do Campo, SP, em 2019, não estava apenas terminando a história de uma instalação no país ou uma mudança de fase. Era também o ponto final para quase um século de montagem e produção dos caminhões de uma das principais marcas do mundo no Brasil, que esteve lado a lado com o desenvolvimento do próprio país.



Você dirigiu ou andou em um F-600? Frequentemente recebemos algumas histórias de saudosos caminhoneiros e também de caminhoneiros de novas gerações que se lembram de seu avô ou seu pai guiando um desse. Ainda é possível ver alguns desses modelos por aí, sendo a maioria peça de colecionador.


Mas clássico é clássico, né? Então, é possível cruzar com um Ford F-600 por alguma estrada! Não deixe de compartilhar essa história com seus amigos do trecho.

Pamela Emerich

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