Hoje é Dia Internacional das Mulheres e uma ótima oportunidade para falarmos não só sobre a importância da mulher no mercado de trabalho como um todo, seja na indústria automotiva, logística ou de transportes de cargas, mas, especialmente, sobre a presença feminina nas estradas como motoristas de caminhão.
Muitas etapas já foram vencidas para que elas pudessem ser quase 1% de todos os motoristas de caminhão pelas estradas do país, mas diariamente existem desafios em comum entre motoristas e os que são exclusivos da mulher caminhoneira, como os filhos, a jornada em casa, preconceito entre colegas de profissão, excesso de funções etc.
Além disso, elas ainda sofrem com os estereótipos da profissão de caminhoneira, fazendo com que carreguem, além de mercadorias no caminhão, o peso do machismo que enfrentam em cada canto do país. Esse universo profissional, ocupado quase na totalidade por homens, acaba revelando o machismo e as dificuldades relacionadas a assédios.
No Brasil, existem 180 mil mulheres aptas a dirigir caminhões, segundo levantamento do Conselho Nacional de Trânsito. Em uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Transporte, em 2019, que abordava o “Perfil do Caminhoneiro”, 99,5% dos motoristas eram homens e as mulheres representavam 0,5% do setor e dirigem, em média, mais de 11 horas por dia. À medida que o tempo passa e que iniciativas a favor das mulheres surgem, a presença feminina nas cabines pelo Brasil aumenta.
De acordo com o SEST (Serviço Social do Transporte) existem mais de 900 mil vínculos trabalhistas no setor de transporte no Brasil e desse total 120 mil são mulheres. As que atuam como motoristas são pouco mais de 4 mil, incluindo os carros auxiliares das empresas, não somente caminhões e carretas. Como no Brasil há aproximadamente 2 milhões de caminhoneiros na ativa, estima-se com a projeção dos dados da pesquisa da CNT, que devem existir cerca de 10 mil mulheres nas cabines dos caminhões rodando pelas estradas do país.
Um dos obstáculos que as mulheres mais enfrentam é o grande preconceito por parte da maioria dos trabalhadores desse setor, que alegam que mulheres não sabem dirigir bem. Porém, uma pesquisa realizada pelo Instituto Renault provou o contrário: dados mostraram que 70% das infrações cometidas no trânsito são feitas por homens e eles são os causadores de 71% dos acidentes. De acordo com o estudo, apenas 15% das mulheres ultrapassam o sinal amarelo e com os homens essa porcentagem chega a 65%.
São muitas as histórias que vão e vem pelas estradas de mulheres destemidas, como a representante para lá de veterana da categoria Nahyra Schwanke, de 92 anos. A alemã chegou ao Brasil quando ainda era um bebê. Dona Nahyra é considerada a caminhoneira mais velha do Brasil e também a mulher que durante mais tempo trabalhou ao volante de um caminhão. Ela ingressou na profissão em 1957, quando tinha 28 anos. Inicialmente, fazendo o transporte de mercadorias para o pequeno comércio de sua família.
Caminhoneira Nahyara Schwanke
Apesar de ter se aposentado há alguns anos, dona Nahyra ainda viaja em seu Mercedes-Benz Axor. Porém, quem dirige agora é um motorista contratado por ela. Há 64 anos as estradas eram bem diferentes. Porém, o tempo foi passando e o que era fruto de uma necessidade virou paixão. Dona Nahyra disse que, apesar de muita gente romancear sua trajetória, nem tudo foram flores. Sobretudo, quando tinha de ficar mais de 30 dias longe de casa e da filha ainda pequena.
Além de ser raro haver caminhoneiras em uma época em que a profissão era ainda mais tipicamente masculina, havia vários problemas, como a péssima infraestrutura, a precariedade das condições das estradas e a inexistência de locais exclusivos para mulheres nos postos de parada e terminais logísticos.
A caminhoneira Nahyra Schwanke
Segundo Dona Nahyra, até metade dos anos 70 não havia sequer banheiros femininos nos postos de parada, simplesmente porque não haviam caminhoneiras. Por isso, em cada parada, ela precisava contar com a ajuda de amigos caminhoneiros e frentistas. Apesar disso, ela diz que nunca teve medo de viajar sozinha e que todos os colegas sempre a respeitaram. Para ela, graças a seu profissionalismo, ganhou a admiração dos embarcadores.
Dona Nahyra conta que apenas nos anos 1980 surgiram mais mulheres interessadas em atuar na profissão de caminhoneira e a partir daí as condições para elas foram melhorando. Um dos pontos que ela destaca é a melhoria das estradas, que evoluíram muito ao longo dos anos, assim como os caminhões foram ficando mais modernos, facilitando a vida de todos os motoristas, inclusive das mulheres.
Mais de seis décadas se passaram e Dona Nahyra acompanhou a evolução de todo o setor de transportes como a participação feminina no setor. As mulheres já estavam presentes nas estradas como companhia de seus maridos caminhoneiros e muitas começaram sua própria trajetória a partir dessas experiências. A veterana destaca que se houvesse condições mais adequadas, a participação feminina poderia ser maior.
Hoje, os desafios não são muito diferentes de antigamente, como o preconceito, que de acordo com muitas caminhoneiras tem diminuído, a jornada dupla, já que a maioria das mulheres ainda precisa dar conta do trabalho em casa e a falta de segurança nas estradas, o que ainda é preocupante. Mas o grande problema ainda parece ser a infraestrutura nas estradas, que mesmo que tenha melhorado muito de alguns anos para cá, ainda pode melhorar mais, se adaptando totalmente à realidade das mulheres caminhoneiras.
A caminhoneira Nahyra Schwanke à frente de um 1944-S que ela tinha, antes de trocar pelo modelo mais atual (Foto: Arquivo Pessoal)
A boa notícia é que algumas empresas se mobilizam para transformar esse cenário. De toda forma, aquelas que já se tornaram mulheres caminhoneiras chamam a atenção do mercado, pois as empresas já se deram conta de ao menos duas características interessantes das mulheres ao volante de um veículo pesado.
Como vimos, o crescimento das mulheres caminhoneiras nessa profissão só tem a contribuir. A presença delas nesse mercado pode ajudar a todos a serem mais conscientes de suas responsabilidades, em especial, com relação à segurança no trânsito e organização no trabalho.
As mulheres caminhoneiras querem ter mais liberdade, tanto financeira quanto poder conhecer outros lugares, além da possibilidade de escolher como, quando e onde querem trabalhar. Percebe como essas coisas estão relacionadas umas às outras? O empoderamento das mulheres, impulsionado por muitos movimentos que se intensificaram nos últimos anos, leva ao protagonismo delas em posições que antes eram inimagináveis. De uma coisa você pode ter certeza: todos ganham com essa diversidade nas estradas!
Nessa singela homenagem às guerreiras das estradas do Brasil, conseguimos trazer à luz os desafios e dificuldades que elas encontram diariamente nas estradas do país há anos, com a intenção de estimular ações que melhorem suas condições de trabalho. Não importa a época, a vida de caminhoneira é resultado de muita determinação, fé, coragem e respeito.
Que tal parabenizar aquela colega de trabalho que está todos os dias na mesma luta que você? Não esquece de celebrar também com a Cristal, já que sem elas seria bem mais difícil para os caminhoneiros. Compartilhe com seus amigos do trecho!
Pamela Emerich
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